Há casos que o poder judiciário pode conceder Habeas Corpus preventivo para autorizar a importação e cultivo de sementes de cannabis para fins medicinais. Confira a matéria realizada pelo jornal Extra Globo e a nota do advogado Dr. Luis Gustavo Delgado Barros acerca dos motivos que fundamentaram o pedido de Habeas Corpus.
A 15ª Vara Federal de Brasília concedeu uma decisão liminar em um habeas corpus preventivo autorizando que um paciente importe e plante sementes de cannabis para fins medicinais no Brasil. A defesa havia solicitado o habeas corpus para que o paciente não se torne alvo de investigações ou acusações de tráfico de drogas pela utilização do insumo da maconha.
O nome do paciente foi mantido sob sigilo. Segundo a defesa do paciente, ele possui recomendação médica e autorização da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para importar um óleo à base de cannabis produzido por uma empresa dos Estados Unidos, mas o preço elevado do medicamento inviabilizou sua aquisição para o tratamento de saúde. Por isso, a defesa decidiu recorrer à Justiça para poder importar diretamente as sementes de cannabis e fazer o cultivo da maconha para uso medicinal.
“Embora tivesse autorização da Anvisa para importar o óleo produzido por empresa estadunidense, o preço elevado era um obstáculo intransponível à compra de remédio de suma importância, conforme prescrição médica, escancarando a dificuldade ao acesso isonômico aos produtos derivados da cannabis, embora haja inúmeras comprovações científicas de suas propriedades terapêuticas. Por esses motivos, decidimos entrar com a ordem de habeas corpus, a fim de garantir ao paciente dignidade e acesso à saúde”, afirmou em nota o advogado Luís Gustavo Delgado, um dos autores do habeas corpus.
De acordo com o juiz federal Rodrigo Paiva Bentemuller, da 15ª Vara Federal de Brasília, “há demonstração de melhora do quadro clínico do paciente deste HC, desde que respeitadas as devidas prescrições médicas, salientando-se também o uso estritamente pessoal e intransferível, sendo proibida a sua entrega a terceiros, doação, venda ou qualquer utilização diferente da indicada”.
“In casu, ante os relatórios médicos colacionados aos autos e diante da própria autorização expedida pela Anvisa para importação de fármaco derivado da cannabis, entendo pela possibilidade de emitir salvo conduto em favor do paciente para que as autoridades impetradas se abstenham de adotar quaisquer condutas que possam obstar o objetivo da mesma, qual seja, a importação e cultivo da planta de cannabis destinada ao tratamento de sua saúde”, escreveu o juiz em sua decisão liminar, proferida na quarta-feira.
“Pelo exposto, DEFIRO o pedido liminar para que as autoridades responsáveis pela repressão e investigação das condutas penais ligadas ao tráfico de drogas, inclusive da forma transnacional, abstenham-se de promover quaisquer atos que atentem contra a liberdade física, bem como de apreensão e/ou destruição dos materiais e insumos destinados ao tratamento da saúde do paciente, tendo originado da cannabis como um dos elementos ou o principal, dentro dos limites da prescrição médica”, escreveu o magistrado.
É possível que o Poder Judiciário conceda autorização para que a pessoa faça o cultivo de maconha com objetivos medicinais?
De acordo com a6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é possível a concessão de salvo-conduto para permitir que pessoas com prescrição médica para o uso do canabidiol cultivem plantas de maconha e dela façam a extração do óleo.
STJ. 6ª Turma. RHC 147.169, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 14/06/2022.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.972.092, Rel. Min. Rogerio Schietti, julgado em 14/06/2022.
A previsão legal acerca da possibilidade de regulamentação do plantio para fins medicinais, art. 2º, parágrafo único, da Lei nº 11.343/2006, permite concluir tratamento legal díspar acerca do tema: enquanto o uso recreativo estabelece relação de tipicidade com a norma penal incriminadora, o uso medicinal, científico ou mesmo ritualístico-religioso não desafia persecução penal dentro dos limites regulamentares.
Embora a legislação brasileira possibilite, há anos, a permissão, pelas autoridades competentes, de plantio, cultura e colheita de Cannabis exclusivamente para fins medicinais ou científicos, fato é que até hoje a matéria não tem regulamentação ou norma específica, o que bem evidencia o descaso, ou mesmo o desprezo – quiçá por razões morais ou políticas – com a situação de uma número incalculável de pessoas que poderiam se beneficiar com tal regulamentação.
O cultivo de planta psicotrópica para extração de princípio ativo é conduta típica, apenas se desconsiderada a motivação e a finalidade.
A norma penal incriminadora mira o uso recreativo, a destinação para terceiros e o lucro, visto que, nesse caso, coloca-se em risco à saúde pública. A relação de tipicidade não vai encontrar guarida na conduta de cultivar planta psicotrópica para extração de canabidiol para uso próprio, visto que a finalidade, aqui, é a realização do direito à saúde, conforme prescrito pela medicina.
O que se pretende com o plantio da Cannabis não é a extração de droga (maconha) com o fim de entorpecimento – potencialmente causador de dependência – próprio ou alheio, mas, tão somente, a extração das substâncias com reconhecidas propriedades medicinais contidas na planta. Não há, portanto, vontade livre e consciente de praticar o fim previsto na norma penal, qual seja, a extração de droga, para entorpecimento pessoal ou de terceiros.
Fonte: https://www.dizerodireito.com.br/2022/06/e-possivel-que-o-poder-judiciario.html
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